A Educação que Emancipa: O aluno aprende melhor ouvindo ou lendo? Observando ou ouvindo explicações?





No livro “O Mestre Ignorante”, Jacques Ranciere escreve sobre o pensamento de Joseph Jacotot, professor na época da Revolução Francesa que teve ideias brilhantes sobre a forma que as pessoas aprendem. A partir de experiências e observações, ele chegou à conclusão que os alunos podem aprender mais e melhor sem as explicações de um professor. Eles podem aprender por meio das explicações e raciocínios no próprio livro ou material didático.



“Eis, por exemplo, um livro entre as mãos do aluno. Esse livro é composto de um conjunto de raciocínios destinados a fazer o aluno compreender uma matéria. Mas, eis que, agora, o mestre toma a palavra para explicar o livro. Ele faz um conjunto de raciocínios para explicar o conjunto de raciocínios em que o livro se constitui. Mas, por que teria o livro necessidade de tal assistência? Ao invés de pagar um explicador, o pai de família não poderia, simplesmente, dar o livro a seu filho, não poderia este compreender, diretamente, os raciocínios do livro?”

O ilustre Jacotot, professor com mais de 30 anos de experiência, compartilhou esses pensamentos em pleno século XIX, o professor Toru Kumon, também com mais de 30 anos de experiência, desenvolveu um método que o aluno aprende sozinho na lógica dos “livros” (material didático autoinstrutivo). Eu e milhares de alunos que estudaram na Escola Técnica Federal no século XX aprendemos física sem professores explicadores, estudávamos em casa e comparecíamos à aula apenas externar o que aprendemos nos “Passos” (provas com 5 questões). Os alunos das Escolas Técnicas Federais eram os melhores nesta disciplina.

Jacques Rancière percebeu que os pensamentos de Joseph Jacotot são tão atuais e por isso trouxe na obra “Le Maître Ignorant” em 1987.

Um aspecto importante destacado por Rancière na obra de Jacotot é que aprender por meio do professor é limitador, pois o aluno fica limitado a aprender com base nos conhecimentos do mestre. Por outro lado, aprender com os livros é caminho para emancipação, pois o aluno pode aprender qualquer coisa e pode aprender sempre. Um outro ponto que devemos refletir sobre o professor explicador é que ele pode sufocar o aluno:

Não se sobrecarrega a memória, forma-se a inteligência. Eu compreendi, diz a criança,não sou um papagaio.Mais ela esquece, mais lhe parece evidente que compreendeu”.

Podemos revolucionar a educação do século XXI com essas formas de aprender. Nos tempos atuais temos muito mais livros e materiais didáticos, além da internet, para possibilitar que as pessoas aprendam sem explicações de um “Mestre Ignorante”.

E qual é o papel do mestre?

O mestre deve ser um orientador para despertar a vontade da criança para que possa desbravar os livros. Para isso, é fundamental que o mestre acredite na inteligência da criança e indique os livros adequados, mas sem deixar de emancipá-lo para outros livros.

O mestre emancipador

Essas contingências haviam tomado, na circunstância, a forma de recomendação feita por Jacotot. Disso advinha uma conseqüência capital, não mais para os alunos, mas para o Mestre. Eles haviam aprendido sem mestre explicador, mas não sem mestre. Antes, não sabiam e, agora, sim. Logo, Jacotot havia lhes ensinado algo. No entanto, ele nada lhes havia comunicado de sua ciência. Não era, portanto, a ciência do Mestre que os alunos aprendiam. Ele havia sido mestre por força da ordem que mergulhara os alunos no círculo de onde eles podiam sair sozinhos, quando retirava sua inteligência para deixar as deles entregues àquela do livro.

Há embrutecimento quando uma inteligência é subordinada a outra inteligência. O homem — e a criança, em particular — pode ter necessidade de um mestre. quando sua vontade não é suficientemente forte para colocá-la e mantê-la em seu caminho. Mas a sujeição é puramente de vontade a vontade. Ela se torna embrutecedora quando liga uma inteligência a uma outra inteligência. No ato de ensinar e de aprender, há duas vontades e duas inteligências. Chamar-se-á embrutecimento à sua coincidência. Na situação experimental criada por Jacotot, o aluno estava ligado a uma vontade, a de Jacotot, e a uma inteligência, a do livro, inteiramente distintas. Chamar-se-á emancipação à diferença conhecida e mantida entre as duas relações, o ato de uma inteligência que não obedece senão aela mesma, ainda que a vontade obedeça a uma outra vontade.

A experiência pareceu suficiente a Jacotot para esclarecê-lo:pode-se ensinar o que se ignora,desde que se emancipe o aluno;isso é, que se force o aluno a usar sua própria inteligência. Mestre é aquele que encerra uma inteligência em um círculo arbitrário do qual não poderá sair se não se tornar útil a si mesma. Para emancipar um ignorante, é preciso e suficiente que sejamos, nós mesmos, emancipados; isso é. conscientes do verdadeiro poder do espírito humano. O ignorante aprenderá sozinho o que o mestre ignora, se o mestre acredita que ele o pode, e o obriga a atualizar sua capacidade

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